Por Marilene Lima
Psicóloga e Mestre em Educação
O trocadilho aprendido numa leitura feita em Ajuriaguerra (1975,
pp. 791-796)¹, é o título deste artigo justamente para o propósito de
esclarecer tanto os pais que “Adotam”, quanto os pais que “Doam”.
Ambos reconheceram a criança, tomaram-na em “Consideração” e
não a relegaram ao abandono. São passíveis de serem bons o suficiente em seus
atos (aparentemente contrários).
Desta forma, aqueles que adotam exercitam sua aceitação, num
primeiro momento, aceitando o “Fruto das Entranhas de uma outra” e, num segundo momento, aceitando o parto da
felicidade ou da infelicidade que a caça pode reservar “jogando seu futuro como se a criança fosse fruto de sua própria
fecunda”.
Da mesma forma aqueles que consentem a adoção exercitam sua
aceitação, num primeiro momento, aceitando que este é seu modo benéfico de
estimar a criança que nasce e, num segundo momento, aceitando que essa nova
família é capaz de propiciar uma vida feliz à criança adotada ao passo que
aceita, também, sua incapacidade – social, psicológica ou física de suprir a
nova vida com suficiência.
Para ambos, quando adotam, a questão da adoção deve estar bem
elaborada, tanto quanto a da doação.
Para uma mãe que não conseguia dizer para sua filha adotada
outra coisa se não: “Eu não vou te abandonar” (como fez sua outra mãe), vê se
que clara não estava a similaridade das duas ações (adoção=doação); ao passo que
revelava, em sua frase, a supremacia de seu ato, em detrimento do ato da
mãe biológica , fazia com que sua
filha tivesse sempre presente em sua vida a “outra” mãe num lugar negativo sim,
porém, cativo.
Já, uma outra mãe que não conseguia dizer não à voracidade
alimentar de seu filho (já que ele havia
passado fome junto a mãe biológica) dizia nas entrelinhas, também da superioridade
de seu ato e
negava qualquer possível semelhança com aquela que lhe dera luz; talvez porque
ignorasse a grandeza do primeiro grande SIM
que conferiu ao filho ao adotá-lo.
Quando digo sobre a questão da adoção estar bem elaborada refiro-me
ao fato de estarem alertas aos motivos de seu desejo de adoção. Devem-se perguntar
(se pretendem adotar uma criança) ou se responder (se já fizeram) a duas
questões fundamentais:
° Como surgiu o desejo?
° Por quê?
Para essas duas
perguntas às respostas não são únicas, mas na medida do possível, devem dizer
respeito mais ao desejo de amar do que à necessidade de ser amado.
Deve-se investigar, também, a opinião do par (casal) sobre
questões como: ilegitimidade (infertilidade) e adultério (impotência) não só
sexual.
Outra questão a ser ponderada é a característica da adoção:
1-
ADOÇÃO TERAPÊUTICA (EGOISTICAMENTE)
Na qual a criança aparece como
“Criança Distração”, “Criança Tábua de Salvação” ou “Criança Colocação” (substituta
do filho morto, perdido, não tido ). Enfim, mais pautada nas próprias dores do
que no desejo de constituir laços e família.
2-
ADOÇÃO CARITATIVA (DE ORDEM
NEURÓTICA)
Na qual o ato da adoção está imbuído
de uma “missão” ou é descrito como total doação.
Dentre os riscos de uma adoção mal elaborada encontram-se os
estreitamente ligados à criança adotada, pois o prognóstico de desenvolvimento
social e intelectual favoráveis está intimamente relacionado às atitudes dos
pais adotivos para com ela, bem como as solicitações culturais e ao clima
familiar no qual cresce/cresceu.
Assim, da somatória desses fatores dependerá o
desenvolvimento sadio da criança e, sem dúvida, se necessário for, recorrer
profissões de ajuda pode fazer a diferença.
No mais, sabe-se que a vida de todas as crianças, adotadas ou
não, apresentam riscos emocionais. O que muda no que se refere à criança adotada
é a intangibilidade de tais riscos, visto que seu passado psicológico e herança
biológica são desconhecidas, na maioria das vezes.
Dentre os riscos neuro/psicológicos mais apresentados pelas
crianças adotadas , tem-se:
-Debilidade intelectual
-Instabilidade emocional
-Problemas de Caráter
Porém, ainda em termos de comparação entre “adotada/não
adotada” quem está livre surpreender-se com sua própria prole?
E só acompanhar o noticiário e ver!
O que essa incerteza tem de ruim pode ser revertida no que
pode surtir de melhor: a incógnita sobre o futuro existe para todos, mas se
angustia a família adotiva, a mesma deve investigar suas formas de exercer sua
parentalidade e, por serem pessoas mais abertas e sensíveis às suas
vulnerabilidades (infertilidades, carências, incapacidades sindrômicas) podem
tornar-se pessoas capazes de alimentar seu desejo de ser pai e mãe, pois:
“Ser pai ou mãe não é só ter um filho, é também, uma
oportunidade para refletir a respeito de sua descendência”¹ e ser uma pessoa
melhor!
O futuro da criança adotada
1- Evolução Intelectual: desenvolvem-se
normal e a depender:
a) da atitude dos pais adotivos,
b) das solicitações culturais;
c) do clima familiar no qual a criança cresce
2- Seu desenvolvimento psicológico depende
de múltiplos fatores, dois deles são:
A) Atitude dos pais (extremamente perfeccionistas e ansiosos
quanto a seu futuro).
B) Situação da criança em si enquanto criança adotada
De acordo com o andamento da inter-relação e da qualidade da
troca fraterna, entre pais adotivos e criança adotada pode-se chegar à perturbações
psicológicas como sintomas de quadros da percepção que a criança faz de sua
família: não encontra na família uma segurança básica igual a de uma criança
legitima em sua própria família.
Contar ou não contar a adoção:
A criança deve conhecer sua condição entre os três ou quatro
anos, quando ainda não está na escola. Para tal, deve-se empregar a palavra adoção
e dizer que foi ESCOLHIDA ou que foi PREFERIDA.
A depender da forma como acontece e da maturidade psicológica
da criança a revelação pode gerar agressividade e turbulência, como reflexo da
ansiedade (sobre o retorno dos pais biológicos: insegurança); dependência manifesta
ou comportamento aderente, ambos os quadros como sintomas da angústia de
separação (como revelação do medo de ser abandonada pelos pais adotivos).
Quanto ao como dizer sobre os pais biológicos, menos
importantes são as palavras empregadas e, mais importantes são as atitudes e
sentimentos comunicados à criança.
Os problemas da criança adotada não dependem unicamente dela,
mas também dos pais adotivos, da família adotante e das relações interpessoais,
ou seja, da criança adotada em uma sociedade determinada. Vale lembrar que, no
âmbito do direito, os filhos adotados têm os mesmos direitos e deveres dos
filhos legítimos.
Adoção: ESCOLHA
Eximir (diminuir) a culpa do outro(a mãe), biológica sem
vangloriar o ato de adoção. Deixar claro em palavras e atitudes a equidade.
Doação: Não é ABANDONO, é consentimento à ADOÇÃO.
A doação com vistas à adoção é sinal de amor, é agir de modo
benéfico ao estimar que a criança que acaba de nascer só poderá ter uma vida
feliz se for adotada.
ADOÇÃO
----------------------------------------------- DOAÇÃO
(equilíbrio)
(mesmo material de um e de outro)
Ambos atos magnânimos permeados de amor. Enaltecer a adoção
em detrimento da doação pode levar a criança a se achar devedora. Só se vai
sossegar o interior da criança no momento em que os pais adotivos sentirem
equilíbrio entre os atos.
Aos pais adotivos deve-se esclarecer uma vantagem sobremaneira
importante: que a qualidade e a intensidade do amor destinado aos filhos adotivos
serão sentidas cotidianamente pela criança.
¹ AJURIAGUERRA, J. Manual
de Psiquiatria. 2ª Ed. Barcelona, Toray Masson, 1975.
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